Josué Montello, maranhense ilustre, romancista, membro da Academia Brasileira de Letras, ao proferir discurso de recepção ao seu conterrâneo José Sarney, na Casa de Machado de Assis, deu ao recipiendário e à plateia uma explicação curiosa e sábia:
“Nossa imortalidade – disse ele –, ao contrário do que se presume lá fora, não é a vida perene – é apenas o nome repetido. A repetição do nome, que conduz à ressurreição da obra literária, constitui todo o nosso mistério. Uma geração vai, outra geração vem, e assim repetimos os nomes dos nossos antecessores, nossos sucessores repetirão o nosso, com igual sentimento de veneração afetuosa”. (https://www.academia.org.br/academicos/jose-sarney/discurso-de-recepcao).
No Brasil, as academias de letras alcançaram uma abrangência que vai além dos cenáculos literários propriamente ditos e congrega grupos outros em áreas científicas e/ou sociais. Daí termos as academias de ciências, academias de medicina, academias jurídicas e muitas outras.
No Piauí, a 13 de abril de 2002, portanto, há mais de 23 anos, era instalada a Academia de Letras da Magistratura Piauiense – ALMAP. Relembro aqui minhas palavras de orador oficial naquela solenidade de instalação:
“O juiz precisa da Arte! Familiarizar-se com ela é capacitar-se para entender melhor a vida. Sem compreender a vida, como poderá julgar o seu semelhante? O operador jurídico trabalha com o fato social. E este nada mais é senão a exteriorização da natureza humana. Esforçar-se por compreendê-la, eis a preocupação dos justos.”
O inolvidável jurista Celso Barros Coelho, por ocasião de sua posse na Academia Piauiense de Letras, em 29.5.1967, proferiu as seguintes palavras:
“Não podemos confundir literatura com ciência, nem as belas letras com a técnica. Mas temos de convir que não podem viver indiferentes, como realidades que se desconhecem, como valôres que se excluem. Uma deve existir em função da outra, pois tôdas são inseparáveis do tempo e se colocam a serviço do homem em sua luta no mundo.” (in: Revista da APL, edição do cinquentenário, 2º volume, 1972, p. 60).
Assim é que desde a sua fundação, a Academia de Letras da Magistratura Piauiense tem cumprido o seu desiderato, qual seja o de incentivar e promover a produção literária entre os integrantes da magistratura piauiense; produção literária em sentido amplo, muito oportuno que se diga. Sendo o julgador necessariamente um estudioso do Direito e um auscultador das angústias humanas, pode e deve ele dar a conhecer ao mundo esse valoroso repositório de conhecimento científico e de experiência de vida, fazendo-o em forma de obras jurídicas e/ou literárias. É alvissareiro dizer que entre os integrantes da magistratura piauiense há um número expressivo de magistrados com livros jurídicos publicados, sendo considerável, também, uma boa parcela daqueles que se têm enveredado pela seara da poética e da ficção. É necessário lembrar, todavia, que o ingresso nos quadros da nossa Academia de Letras da Magistratura Piauiense, considerados os objetivos a que ela se propõe, não exige a satisfação do pré-requisito da publicação de livro e/ou que o candidato ostente a condição de escritor. O magistrado é, por natureza de sua função judicante, um escritor; um escritor de sentenças, aquele que cultua o vernáculo e prima pela objetividade e pela clareza do texto decisório.
Nesta manhã, em sessão solene, reúne-se a nossa augusta instituição para dar posse ao eminente Desembargador ERIVAN JOSÉ DA SILVA LOPES na cadeira n° 2, que teve como último ocupante o saudoso Desembargador Osíris Neves de Melo Filho, falecido em 20 de março de 2023. Referida cadeira tem como patrono Antero Coelho de Rezende, um magistrado que integrou, em momentos apartados, as magistraturas do Piauí e do Amazonas, e deixou nos anais do judiciário piauiense os registros de uma trajetória retilínea e de muita operosidade. Quanto ao último ocupante da cadeira 2, em afirmativas de reconhecimento, de elogio e de saudade, em oração panegírica, realizada por este sodalício em data de 22.8.2023, a respeito de Osíris Neves de Melo Filho, disse este orador naquela oportunidade:
“Entre os colegas de magistratura, foi um líder, condição que conquistou não pelo verbo, senão pela humildade, pela sinceridade, pelo trabalho e pela dedicação em defesa dos direitos da categoria dos magistrados estaduais. […] Foi de sua iniciativa, como presidente da AMAPI, nos idos de 1992, a ideia que se transformou em efetiva contratação de um plano de saúde suplementar para a magistratura estadual piauiense.”
Senhor presidente, senhoras e senhores acadêmicos! Eis que é chegado o momento de discorrer sobre a figura de Erivan José da Silva Lopes, natural de Santo Antônio de Lisboa (PI). Filho de José Lopes da Silva e de Francisca Ana da Silva. O magistrado, o cidadão, o ser humano, o novel acadêmico que, de hoje em diante, vinculará o seu nome de forma perpétua à cadeira número 2 da Academia de Letras da Magistratura Piauiense.
Conheci-o, pessoalmente, nos anos 1990, creio que em 1997, na comarca de Oeiras. Eu era o juiz de direito da referida comarca e juiz da 5ª zona eleitoral; ele, o advogado, militante na comarca de Picos e regiões circunvizinhas. Chamaram-me a atenção, como julgador, as suas petições escorreitas, com muita força jurídica nos argumentos para demonstrar que as provas e o Direito estavam nos autos, estavam com o seu constituinte. Tratava-se de um complicado caso de alegação de fraude eleitoral por violação de urna de lona, procedente da comarca de Picos e respectiva Zona Eleitoral. Dei seguimento à tramitação do processo. Ao fim da instrução, constatei que as provas estavam, realmente, nos autos. O constituinte do advogado Erivan Lopes estava com a razão. Decidi. Anulei o pleito e cassei o mandato do gestor municipal de São José do Piauí. Houve recurso. Deixando a comarca de Oeiras e tornando-me juiz de direito de Parnaíba, não sei dizer sobre o desfecho daquele feito judicial eleitoral nas instâncias superiores.
Para descrever, de forma sintética, o valoroso curriculum vitae do novel acadêmico, consigno aqui esta sequência de informações: Bacharel em Direito pela Universidade de Fortaleza (CE), advogado, Promotor de Justiça do estado do Piauí, Desembargador do Tribunal de Justiça do estado do Piauí, membro e presidente da 2ª Câmara Criminal do TJPI, membro de presidente da Câmara de Direito Público do TJPI, Vice-Diretor da Escola Judiciária do estado do Piauí, mestre em Direito Constitucional pela Universidade de Lisboa(Portugal), presidente do Tribunal de Justiça do Piauí, vice- presidente e Corregedor do Tribunal Regional Eleitoral do Piauí, presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Piauí, Corregedor Geral da Justiça do estado do Piauí.
Eis aqui, neste breve período de texto, o resumo curricular de Erivan Lopes. Eu encheria laudas e consumiria muito tempo, senhoras e senhores acadêmicos, se fosse relacionar os seus grandes feitos como gestor. Ousarei destacar dois, dos maiores entre os grandes: primeiro, a implantação do sistema SEI na burocracia judiciária administrativa de nosso Poder Judiciário; segundo, a concepção da ideia, a consecução do imóvel e dos recursos financeiros para a obra, e o início da construção do Palácio da Justiça, a majestosa sede do Poder Judiciário piauiense, que hoje se vê erguida aqui na avenida Padre Humberto Pietrogrande, em nossa capital. Tomar decisões inteligentes, exequíveis e pragmáticas, fundamentadas e convincentes sempre, seja na área jurisdicional, seja na área administrativa, dizem tudo sobre a sua maneira de ser como juiz e como gestor público. De minha longa convivência funcional com o colega magistrado Erivan Lopes, posso dizer, fazendo-o aqui, também, em nome desta Academia de Letras da Magistratura – que é ele um cidadão que se porta com lhaneza no trato, um ser humano alegre, atencioso e prestativo, um julgador atualizado, com espírito republicano e democrático, altivo e austero no cumprimento dos seus deveres funcionais. Fora do ambiente funcional e da liturgia do cargo, na sua gleba de plantação e criação, mostra-se como genuíno homem do campo, que bem sabe valorizar os frutos da terra e dos currais. Quero vê-lo, ainda, como um voraz leitor de romances.
01/07/2025