
A miniaturização da vida
No final deste notável romance que é Caminhos Cruzados, de Erico Verissimo, Clarimundo, professor de matemática, resolve tocar um projeto antigo: escrever um livro em que um ET relatará como vê o nosso mundo e a humanidade. Começa, naturalmente, pelo prefácio, onde se queixa de que a vida é chata, monótona. Da janela de seu quarto, prossegue o professor, ele vê numerosas pessoas, empenhadas no “ramerrão cotidiano”. Entre parênteses, são estas as pessoas cujos dramas, tragédias e comédias Érico acabou de narrar nas 286 páginas precedentes. Mas, diz Clarimundo, “debalde os romancistas tentam nos convencer de que a vida é um romance”; ele simplesmente não acredita nisso. Ao terminar o prefácio, Clarimundo tem um sobressalto: na chaleira que deixou no fogão, a água ferve, “a tampa dá pulinhos, ameaçando saltar”. Num pulo, Clarimundo tira a ameaçadora chaleira do fogo. “Quase me acontece um desastre!” – pensa.