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Artigos

  • E no quinto ano Ele descansa

    Fico meio desconfiado - pra que negar -, mas a verdade é que tenho sentido, nas últimas semanas, que há um novo alento em muitas áreas. Não entendo nada de indicadores econômicos, nem sequer domino economês elementar, mas parece que esqueceram aquela conversa de crescimento baixo ou falta de infra-estrutura ou criminalidade desenfreada e está todo mundo satisfeito, ou quase todo mundo. Balança de pagamentos favorável, reservas em alta, exportações também, montadoras de automóveis sem conseguir atender à demanda, uma coisa maravilhosa mesmo. A imprensa, como sempre, inclusive eu, procura ver defeitos aqui e ali, mas manda a boa consciência reconhecer que ultimamente emanam vapores perfumados de alguns comentários de jornais e se abrandam diversos dos muitos que antes vociferavam.

  • O pulha de cada um

    Embora a palavra seja um pouco forte, todos nós temos um pulha na vida (o dicionário Aurélio define o termo como indivíduo sem caráter, sem dignidade, sem brio).

  • A clareza de uma poesia

    Se o parnasianismo deixou saudades e de vez em quando volta, outra tendência há que não foi aproveitada com força total, embora tenha produzido alguns de nossos melhores poetas: o simbolismo. E é natural que tal haja ocorrido. Toda literatura é simbólica, apesar de nem toda literatura ser simbolista. No domínio do simbólico está uma preeminência de forma, aliada a uma exatitude de conteúdos que me parece uma das melhores conquistas da corrente de Cruz e Souza, Antonio Francisco da Costa e Silva, Tasso da Silveira e Cecília Meireles.

  • PF e as buscas

    O irmão do presidente da República, Genival Inácio da Silva, teve sua casa revistada pela Polícia Federal, que buscava elementos comprometedores de suas atividades como intermediário entre particulares e empresas federais. A polícia investiga o tráfico de influência para proteger os negociantes de caça-níqueis. Essa é uma velha história, na qual aparece um parente do presidente da República, muito próximo da possibilidade de obter vantagens do titular do poder supremo e capaz de resolver situações difíceis de um jogo proibido.

  • Decoro parlamentar

    RIO DE JANEIRO - Na primeira legislatura após a queda do Estado Novo, um deputado federal foi cassado por seus pares por quebra do decoro parlamentar. Ele não recebia mensalão, não respondia a nenhuma CPI, mas foi julgado incompatível com a austeridade que se cobrava de um representante do povo, depois de anos da ditadura Vargas.

  • A volta da Guerra Fria

    Deixo de lado os interesses movido pelos integrantes do G-8 na reunião realizada no balneário alemão de Heiligendamm. Fixo-me, exclusivamente, no interesse de observador que vê reacender-se, não sem perigo, embora ainda remotamente, a Guerra Fria entre a Rússia e os EUA. Belicamente, a Rússia não tem mais o seu Exército Vermelho, que fazia tremer todos os obstáculos táticos e estratégicos levantados para defesa do território russo. Também os EUA não sabem como sair do imbróglio na antiga Babilônia.

  • Opinião: Do cinismo ao exorcismo cívico

    Chegamos ao meio do ano com o avanço mais fundo - e talvez irrevogável - do que seja, à custa dos escândalos, o aprofundamento da nossa democracia. Viraram-se as páginas da contumácia com a corrupção, com direito ao cinismo cívico, que permite a exaustão das manchetes, que não se lêem, não se ouvem, tanto a falcatrua passe, do anedótico, a um novo grotesco. Não se repetiu ainda o flagrante dos dólares na cueca dos meliantes. O novo espanto é bom e vem de outro lado, com a polícia a chegar aos gabinetes e à cornucópia das contas da cosanostra, e à família presidencial sem que, do Planalto, algum freio se levante. A reação presidencial à "falta de cabeça" de Vavá deu nova enxurrada de apoio a Lula na opinião pública, que sabe que agora não é só pobre que anda de camburão.

  • Napoleão e Lula

    RIO DE JANEIRO - Pode ser lenda, mas vários de seus biógrafos adotaram a cena e a frase como verdadeiras. Numa de suas batalhas -alguns autores dizem que foi em Arcole, outros em Lodi-, Napoleão tomou a frente de sua tropa e enfrentou a chuva de balas que matavam seus soldados à direita e à esquerda. Um deles advertiu o general para o perigo, Napoleão respondeu: "Ainda não foi fundida a bala que me matará".

  • Empreiteiros e contratadores

    É preciso ficar claro que as obras públicas são submetidas a lances públicos, resultando em melhor aproveitamento para o licitador e que corresponda ao maior número de quesitos submetidos pelo licitante. Supõe-se que o mandatário eleito responda perante a opinião pública e a Justiça quanto a essa licitude. Ao eleger um mandatário, a opinião pública o considera imbuído dos predicados e que, por isso mesmo, dispõe de tempo suficiente para atender à Justiça Eleitoral, que representa os valores jurídicos que devem ser observados em todas as transações que envolvam o poder público e os contratos de obras públicas a serem realizadas. O poder público procura se cercar de todas as maneiras, para que transpareça a óbvia clareza dos negócios em questão. E para proteger o mandatário consagrado pelas urnas como merecedor da confiança do povo que o elegeu.

  • O cerco ao Brasil

    O Brasil sofre na América do Sul uma onda de hostilidade cujas motivações são absolutamente demagógicas e populistas. Nossa conduta com nossos vizinhos sempre foi exemplar. Esse quadro exige de nossa diplomacia um trabalho equilibrado e competente, que ela tem exercido bem, com o aprendizado da arte de engolir sapos.

  • Consolidação legislativa

    “O parlamento não é fábrica que deva recomendar-se pelo número de projetos que elabore ou pela rapidez com que os produza... Às vezes a maior virtude de um parlamento está precisamente no número de projetos que elimina ou depura, que corrige ou substitua, depois de estudo quanto possível minucioso dos assuntos.” A observação é de Prudente de Morais Neto, jornalista descendente do ex-presidente, que escrevia sob o pseudônimo de Pedro Dantas, e está registrada no livro Quase Política, de Gilberto Freyre.

  • Quanto mais velho, melhor

    A frase lembra o  que se diz sobre o vinho. Estamos pensando em seres humanos, apesar de abominarmos a palavra “velho”. Uma vez, o arquiteto Oscar Niemeyer, às vésperas dos 100 anos, disse-nos que “a velhice é uma droga”. Na mesma época, Fidel Castro fez o seu depoimento: “Nenhum perigo é maior do que os relacionados com a idade e uma saúde da qual abusei, no tempo que me correspondeu viver.”

  • O obsoleto Brasil dos amigões

    O atabalhoado da crise nessas últimas semanas leva a novas conquistas democráticas. Ainda em susto, continuamos a acreditar que a melhoria de um sistema se faz sempre harmoniosamente, em progressão imperceptível. Ao contrário, é aos trancos e barrancos que se chega agora a um novo Brasil que aperfeiçoa as suas instituições. E o que mais reconforta é ver o quanto a sociedade civil se espanta jubilosamente com a novidade e a quer, para ficar.

  • Maura Lopes Cançado

    Lia pouco, observava muito; sua frase era simples, não erudita, mas de uma precisão cruel Sinceramente, não fiquei surpreendido. Em 2003, quando fazia uma série de palestras na Sorbonne (Nantes, Lyon, Rennes e Paris), um jovem professor pediu-me para falar sobre Maura Lopes Cançado, cujo livro "O Hospício É Deus" estava estudando para uma tese de doutorado na própria Sorbonne. Ele sentia dificuldade em encontrar material crítico e biográfico sobre a autora, sabia vagamente que eu fora seu amigo -estava citado no livro- e guardara uma crônica que eu publicara na Ilustrada há tempos, falando de Maura e um pouco de sua personalidade humana e literária. Passa o tempo e recebo, no último sábado, a visita de uma aluna que a escolheu como tema de sua tese de mestrado na PUC-Rio. Forçando a memória, lembro que, no passado, estudantes de faculdades espalhadas pelo Brasil já me haviam escrito pedindo informações sobre Maura, que também tem outro livro publicado ("O Sofredor do Ver") e uma série de contos no "Suplemento Dominical" do "Jornal do Brasil", no final dos anos 50. É um fato mais ou menos comum em todas as literaturas: escritores de talento, alguns beirando a genialidade, passam desapercebidos por seus contemporâneos e somente aos poucos vão conquistando espaço entre os estudiosos fatigados de analisar as obras já exaustivamente analisadas pela massa crítica que se forma nas academias, nas editoras e na mídia. Temos alguns exemplos entre nós -e o de Maura me parece o mais recente e emblemático. Morreu há pouco, esquecida e conformada, aparentemente curada da loucura que a levou a diversas internações em hospícios e clínicas psiquiátricas. Não mais escrevia, não procurava ninguém e por ninguém era procurada, a não ser por seu filho, Cesarion Praxedes, que morreu dois anos atrás. Naqueles anos, eu também colaborava no "SDJB" e freqüentava o andar ocupado pelo suplemento, cuja fauna está toda citada nos livros de Maura: Reynaldo Jardim, Ferreira Gullar, Assis Brasil, Mário Faustino, José Guilherme Merquior, Carlos Fernando Fortes Almeida, José Louzeiro, Alaôr Barbosa, Walmir Ayala, Barreto Borges, Oliveira Bastos e outros que agora não lembro. Reynaldo Jardim foi o criador e era o editor do "SDJB", recebeu um conto de Maura e ficou entusiasmado, publicou-o na primeira página, na diagramação competente de Amílcar de Castro. Foi o início de uma série de contos magistrais; falou-se em Katherine Mansfield, em Mary McCarthy e, principalmente, em Clarice Lispector, que parecia a influência mais próxima da desconhecida contista. Estava longe de ser uma imitadora. Seu universo era mais denso e concentrado naquilo que, mais tarde, ficamos sabendo ser a sua loucura. Eu havia estreado na literatura em 1958, e Maura me procurou, dizendo que desejava escrever um romance. Tirei o corpo fora, não se ensina ninguém a escrever um romance, um ensaio, uma poesia. Ajudei-a apenas materialmente, dando-lhe uma máquina de escrever. O resultado foi "O Hospício É Deus". Não se trata de um desabafo. Mas de um mergulho complicado no seu universo interior, quando a matéria da carne se decompõe antes da morte, e sobra apenas a convulsão, "a noite escura da alma" (Maura nunca leu São João da Cruz). Convulsão que ela experimentou fisicamente na série de eletrochoques, nos acessos de cólera contra o mundo e contra a humanidade. Em duas de suas crises mais violentas, matou uma enfermeira e um namorado, cumpriu pena em presídios psiquiátricos, foi libera- da por parecer de médicos que a examinaram e por juízes que absolveram. Era doce quando superava a loucura, amante, querendo aprender tudo para melhor desprezar o mundo e a humanidade. A literatura poderia ser o seu refúgio, se Maura acreditasse nela mesma e na própria literatura. Lia pouco, observava muito; sua frase era simples, não erudita, mas de uma precisão cruel. Não era feia, mas se julgava belíssima. Adolescente em Minas, ganhou um avião de seu pai, pilotava bem, batizou o aparelho com o nome de seu filho, Cesarion. Um acidente cortou a sua carreira -aliás, ela nunca pensou numa carreira, queria apenas ser ela mesma, com as suas manias, o seu sofrimento de ver o mundo e as coisas, a sua loucura, o seu deus.